Este post foi escrito por Christina Chan, Sophie Boehm e Stefanie Tye e publicado originalmente no WRI Insights.
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Desde 2003, mais de quatro mil desastres naturais causaram estragos no Caribe. A região tem enfrentado tempestades cada vez mais frequentes e intensas. Menos de um ano depois de o Furacão Mathew, de categoria 5, atingir os países mais pobres da região, muitos se veem mais uma vez à mercê de uma tempestade – dessa vez, da mais forte já registrada no Atlântico. O Furacão Irma, também de categoria 5, está rasgando o Caribe e assolando ilhas inteiras com ventos de 295 quilômetros por hora. A Ilha de Barbuda perdeu 95% das construções, e 60% dos moradores estão sem lugar para morar. Em Porto Rico, a tempestade derrubou linhas de energia, deixando quase um milhão de pessoas sem eletricidade.
Nesse momento, a população da Flórida (EUA), que se encontra na rota do Irma, prepara-se para uma iminente catástrofe. As autoridades preveem que a tempestade será a pior desde o Furação Andrew, de 1992 – o Irma já tem quase o dobro do tamanho. O governo trabalha com urgência para evacuar a área, e muitos temem que as áreas mais atingidas acabem inabitáveis por semanas.
O Furacão Jose não fica muito atrás. A tempestade provavelmente atingirá os mesmos países pelos quais o Irma já passou, e, no meio do Atlântico, o Furacão Katia também está ganhando força. Pela primeira vez na história moderna é possível que três furacões cheguem à terra praticamente ao mesmo tempo.
Apesar dos danos catastróficos, o número de mortes causadas pelo Irma ainda é de apenas 19. Toda vida perdida é trágica, mas é notável que esse número não seja maior, dada a ferocidade da tempestade. A preparação dos países para desastres naturais certamente contribuiu para salvar milhares de vidas. Para comparação: o Furacão Mathew matou mais de mil pessoas no Haiti, e outras mais de 1.800 perderam a vida com o Furacão Katrina.

Imagem de satélite do Irma, produzida pela NASA (Crédito: UWM/SSEC/CIMSS, William Straka III)
Reconhecendo sua vulnerabilidade diante das novas supertempestades, muitos países passaram a priorizar a gestão de riscos de desastres em seus governos, decisão que ajudou muitas pessoas a sobrevirem ao Furacão Irma. O que esses países fizeram para se preparar contribuiu para reduzir o número de mortes e proteger tanto propriedades quanto infraestruturas cruciais para a população:
- Em 2009, os países do Caribe instituíram a Agência Caribenha de Gestão de Emergências de Desastres, um órgão intergovernamental que ajuda os estados-membros a adotar políticas de mitigação e redução de perdas, coordenar a capacidade de resposta a emergências e oferecer assistência imediata às comunidades afetadas.
- O governo de Antígua e Barbuda acionou a equipe nacional de resposta a desastres e a Cruz Vermelha dias antes de o Irma atingir as ilhas. Funcionários públicos limparam sistemas de drenagem para ajudar as águas da enchente a voltarem ao oceano, criaram abrigos temporários e ajudaram a colocar idosos e pessoas com deficiência em segurança.
- Porto Rico declarou estado de emergência, alertou a Guarda Nacional e preparou 460 abrigos de furacões com bastante antecedência à chegada do Irma.
- Nas Ilhas Virgens (EUA), o governo revisou as normas de construção, para incluir medidas que tornassem as edificações resistentes aos ventos de furacões, atualizou os sistemas de distribuição de água e melhorou a resiliência da rede elétrica.
- No Condado de Miami-Dade, barragens foram reparadas ou construídas, as estradas na beira-mar foram elevadas, 116 válvulas para ajudar a conduzir as águas de inundações de volta ao mar, os sistemas de esgoto foram atualizados e foram feitos investimentos em novas bombas de águas pluviais, além da exigência de que o primeiro andar de novas construções passasse a ser mais alto.
Mesmo com esforços dessa magnitude para se preparar a fenômenos naturais extremos e se adaptar às mudanças no clima, nenhum país, província ou cidade pode estar completamente pronto para uma tempestade catastrófica. Furacões como o Irma fazem os países retrocederem anos – às vezes décadas, como no caso de nações em desenvolvimento como o Haiti – e minam avanços conquistados com muito esforço para a redução da pobreza. Nessas situações, os governos com frequência precisam realocar recursos destinados a saúde, educação e outros projetos de desenvolvimento para auxiliar as pessoas afetadas pelas tempestades a cobrirem perdas e reconstruírem suas vidas. Muitas comunidades não conseguem se recuperar, e menos ainda reconstruir o que foi perdido, a tempo do próximo furacão.
No entanto, supertempestades como o Irma serão cada vez mais comuns no cenário de mudanças climáticas que vivemos hoje. Os furacões ganham força com a temperatura mais alta das águas dos oceanos; as tempestades se tornam mais fortes à medida que o nível dos oceanos sobe; e os níveis mais altos de umidade no ar mais quente aumentam as chuvas. Os recordes quebrados pelo Irma – ventos de 295 quilômetros por hora, por exemplo – podem se tornar corriqueiros, normais, se os países não conseguirem manter o aumento da temperatura média global abaixo de 2°C até o fim deste século.
A adoção do Acordo de Paris em 2015 foi um divisor de águas e marcou a mudança de rota para um futuro resiliente e de baixo carbono. Porém, como a atual temporada de furacões bem nos lembra, é hora de os países intensificarem seus esforços de combate às mudanças climáticas. Precisamos dobrar a redução das emissões de gases de efeito estufa para atingir as metas estabelecidas no acordo para conter o aumento da temperatura. Precisamos aumentar os esforços para amenizar nossas vulnerabilidades aos impactos das mudanças climáticas. E, por fim, precisamos ajudar os países a superarem as perdas e os danos.
Leia mais: 2050 é agora
Paula Caballero, diretora global do Programa de Clima do WRI, publicou no último dia 7 um artigo peremptório sobre o tema. 2050 é agora, e nós precisamos agir.
A realidade da vida cotidiana é que tentamos resolver os problemas que estão bem à nossa frente, nos encarando face a face. De muitas maneiras, o desejo por resultados em curto prazo dita o ritmo tanto de nossas vidas públicas quanto privadas. Por isso a noção de que as decisões tomadas hoje definirão onde acabaremos daqui a duas décadas é difícil de compreender, visualizar, e pode até mesmo parecer remota.
Mesmo assim, os ciclones tropicais mortais e sem precedentes que hoje assolam o Caribe e todo o mundo antecipam um futuro perigoso se não agirmos agora para combater as mudanças climáticas. Estamos em uma encruzilhada histórica que nos obriga a avaliar o futuro. Porque de uma maneira muito real: 2050 é agora.