Hoje tenho um encontro muito especial. Vou conhecer uma das pessoas mais importantes atualmente quando o assunto é mudanças climáticas, a mexicana e Secretária Executiva da UNFCCC, Patricia Espinosa (à esquerda).
O convite surgiu após a palestra que fiz no What Design Can Do – Climate Change (em português, “O que o design pode fazer – mudanças climáticas”), em Amsterdã, Holanda, em maio desse ano. O assunto era mobilidade ativa e o poder da bicicleta na redução de desigualdades sociais e combate às mudanças do clima. Levei o caso de São Paulo e mostrei como a simples pintura no asfalto de algumas ciclovias (ainda que com problemas, poucos quilômetros e quase nada conectadas) poderia ter um alto impacto na promoção dessa agenda, reconhecendo e dando visibilidade a pedestres, ciclistas, catadores de material reciclável, usuários de cadeiras de rodas e outros “invisíveis” do planejamento urbano.
Apesar de toda e qualquer crítica quanto às ciclovias de São Paulo, existem alguns efeitos colaterais do bem que não podem ser ignorados: essa infraestrutura vem servindo, na verdade, como um espaço ampliado para a cidadania. Uma oportunidade dentro da sociedade do automóvel para perceber a rua a partir de um novo olhar de quem está fora do carro.
As ciclovias fizeram parte de uma série de políticas públicas iniciadas pelo ex-prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, e que são tendência internacional. Entre elas, o fechamento de grandes vias para os carro e abertura para as pessoas (caso da Paulista Aberta aos domingos [veja acima] e minhocão), redução de velocidades para promover mais segurança aos pedestres e ciclistas, construção de Parklets (antigas áreas de estacionamento que se transformam em espaço de convivência), demarcação de áreas 30 e 40, investimento em corredores de ônibus, entre outras iniciativas.
O transporte é parte fundamental das nossas vidas, e é impossível falar em transformação – urbana, social, ambiental, econômica – sem falar em melhorar a maneira como nos deslocamos. Ao aumentar as emissões de gases de efeito estufa (GEE) a taxas mais rápidas do que em qualquer outro setor, o transporte já responde por 22% das emissões relacionadas à energia, de acordo com a Agência Internacional de Energia. No Brasil, políticas de incentivo aos meios de transporte movidos a combustível fóssil são a principal causa de emissões de gases nocivos.
Parece consensual que o setor deve ser incluído nas ações climáticas para alcançar o Acordo de Paris e manter o aumento da temperatura média global abaixo de 1,5°C até 2100. Quase 80% dos compromissos assumidos pelas cidades do C40 passam pelo setor de transportes, mas o foco tem sido a eficiência do combustível e veículos “limpos”. Pouco ou nada se fala sobre a importância da mobilidade ativa – setor que exige uma fatia muito menor de investimentos e com alto grau de retorno em curto prazo.
E esse será o tema do meu café com a Espinosa.
Vou levar para ela um Manifesto pela Mobilidade Ativa assinado por diversas organizações e movimento sociais brasileiros e latinos que trabalham com a promoção de cidades mais seguras e confortáveis para pedestres e ciclistas. Nele, destacamos alguns compromissos, incentivos e orientações internacionais para melhorar a vida nas cidades, reduzir desigualdades, emissão de GEE e combater as mudanças climáticas.
Nenhum país ou cidade do planeta pode negligenciar essa agenda. O compromisso de investir em mais segurança para pedestres e ciclistas é o “marco zero” para qualquer discussão sobre desenvolvimento urbano, humano, saudável e sustentável. Precisamos garantir nas negociações internacionais a presença irrestrita de políticas públicas que favoreçam a mobilidade ativa em todas as cidades do mundo, em qualquer contexto, para todas as pessoas.
A reunião acontece hoje em Bonn, Alemanha, onde fica a sede da UNFCCC – Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima. Sobre o manifesto completo e o papo com Espinosa eu conto na próxima semana. Até lá!
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Aline Cavalcante é jornalista, empreendedora social no oGangorra e luta pelos direitos de pedestres e ciclistas nas cidades desde 2009. Seu trabalho a tornou reconhecida internacionalmente após a participação como personagem principal no documentário Bikes vs Cars.