A intenção de cortar 13% do orçamento dos departamentos de transporte – além de ter assinado um decreto que visa reverter boa parte dos elementos-chave da estratégia climática do país – é outra das recentes ações do presidente americano Donald Trump que demonstram como os líderes das cidades americanas terão um árduo trabalho para continuar adotando soluções de baixo carbono. No entanto, apesar das ações federais, um relatório do TransitCenter destaca como as autoridades locais podem fazer mais mudanças no sistema de transporte do que pensam.
Ilustrado com modelos adotados em diversas cidades, o estudo enfatiza a responsabilidade dos governos locais por decisões primordiais para o funcionamento das vias. Pintar faixas que delimitem espaços para pedestres e ciclistas, por exemplo, bem como decisões sobre a forma que novos empreendimentos comerciais devem se conectar ao transporte da cidade são responsabilidades das prefeituras.
Com linguagem direta e voltada para o empoderamento das lideranças municipais nos Estados Unidos, o relatório diz: “As autoridades locais têm mais influência sobre o transporte do que pensam que têm. Memphis, em Chicago, e muitos outros municípios estão usando técnicas de construção rápida para reconfigurar cruzamentos perigosos, em vez de aceitar mortes no trânsito como algo inevitável. Denver, Massachusetts, e cidades de todo o país estão mudando seus códigos de zoneamento e desenvolvimento para que eles possam continuar a crescer sem grandes aumentos de tráfego automóvel”.
O relatório funciona como um guia de instruções para que prefeitas e prefeitos coloquem em prática as ações necessárias para aumentar a qualidade de vida em suas cidades. A publicação está organizada em torno de quatro pontos principais:
1 – Como aproveitar ao máximo o seu tempo no escritório;
Uma das escolhas as mais importantes que uma cidade faz é colocar a liderança certa em seu departamento de transporte. Os líderes mais bem-sucedidos são os que ligam o transporte a valores mais amplos como segurança e saúde pública – e garantem que esses valores sejam incorporados nos projetos, padrões e métricas de transporte da cidade. Eles convencem seus departamentos a realizar movimentos rápidos, fazer experimentações e medir o progresso de novas tentativas.
2 – Alianças que trazem resultados;
As mudanças de transporte que dão mais certo acontecem com o apoio de aliados fora do governo, como grupos de base, líderes de organizações civis e empresas. Os gestores municipais também têm de lidar com sua agência de trânsito e com o governo estadual.
3 – Faça o máximo com a infraestrutura existente;
À medida que os bairros crescem, é essencial que a cidade otimize o espaço viário, a fim de transportar e acomodar mais pessoas. Priorizar opções de transporte eficientes e sustentáveis, como os modos coletivos, é uma etapa essencial no amadurecimento da cidade. A gestão ativa das calçadas também tem esse efeito.
4 – Reescreva as regras para incentivar o crescimento, não o tráfego.
Muitos regulamentos dificultam os deslocamentos sem carro. Normas antigas muitas vezes obrigam os desenvolvedores a construir garagens de estacionamento e a ampliar as vias para acomodar o trânsito, dificultando a caminhada e até mesmo o fluxo dos veículos. Cada vez mais, porém, as cidades começam a abrir mão dessa norma, atualizar suas normas de trânsito e incentivar outras opções de transporte. Entram nesse processo de reformulação também legislações antiquadas de táxi, que já não se adaptam a uma nova era de transporte sob demanda.
Em matéria recente, o NextCity destacou cinco conselhos principais do relatório:
- Olhe para as vias.
- Foque na praticidade, não no charme.
- Se você não pode mudar, influencie.
- Planeje pensando no transporte sob demanda.
- Reescreva normas que priorizam os carros.
Entre os exemplos de estratégia municipal e planos de ação, o documento destaca: PlaNYC, Chicago Forward, OakDOT Strategic Plan, Visão Zero de Boston e de San Francisco.
“O transporte não existe para si, mas para atender as pessoas. Fundamentalmente, transporte implica acesso: a empregos, escolas, mercados, hospitais. Se a sua cidade é uma daquelas onde a maioria dos destinos só pode ser acessada de carro, grande parte da população será excluída. Uma cidade que oferece opções, permitindo o acesso via transporte coletivo, bicicleta e caminhada, é uma cidade que funciona melhor para todos”, destaca o relatório.
Apesar de ser voltado para lideranças municipais dos Estados Unidos, muitas dessas ações podem ser adaptadas ao contexto brasileiro. Afinal, o paradigma subjacente de que mudanças substanciais só podem ser feitas com o auxílio de verbas do governo federal pode delimitar o potencial que líderes têm para melhorar a cidade. É preciso vontade política e comprometimento para fazer as mudanças necessárias e melhorar as cidades para as pessoas.