O projeto Nossa Cidade, do TheCityFix Brasil, explora questões importantes para a construção de cidades sustentáveis.
A cada mês um tema diferente.
Com a colaboração e a expertise dos especialistas do WRI Brasil Cidades Sustentáveis, os posts trazem artigos especiais sobre planejamento urbano, mobilidade sustentável, resiliência, segurança viária, entre outros. A cada mês, uma nova temática explora por ângulos diferentes o desenvolvimento sustentável de nossas cidades.
Como pensar e viabilizar uma cidade inteligente
“No passado, cidades eram construídas nas margens dos rios. Hoje, são erguidas ao longo de rodovias. Porém, no futuro, elas serão construídas com base na disponibilidade de redes de fibra óptica e infraestrutura da próxima geração”. A afirmação do primeiro-ministro indiano, Narendra Modi, é praticamente incontestável diante da atual realidade e indica uma qualidade que as cidades deverão buscar cada vez mais: inteligência. Neste mês, o Nossa Cidade vai tratar do tema “Cidades Inteligentes”, conceito que está constantemente em evolução, mas que já representa um caminho sustentável em meio à urbanização acelerada.
Atualmente, não existe nenhuma definição universal que defina cidades inteligentes, ou “Smart Cities”. As abordagens variam muito de acordo com a situação econômica, cultural e histórica de cada cidade. Porém, a ideia que geralmente permeia a imagem de uma cidade inteligente é a busca pela sustentabilidade e pelo correto uso dos recursos naturais aliados ao emprego da tecnologia de ponta. Mais que isso, uma cidade que coloca o cidadão em primeiro lugar.
Enquanto o número de pessoas nas grandes cidades cresce – até 2050 estima-se que a população mundial alcance mais de 9 bilhões, com 80% dos habitantes residindo em cidades -, os problemas urbanos vão se tornando mais complexos. Conter as mudanças climáticas é um dos principais desafios mundiais da atualidade e a chave para isso está justamente nos grandes centros urbanos. A evolução da tecnologia da informação, da comunicação e o aumento no volume de dados disponíveis trouxe oportunidades para o combate às emissões de gases poluentes através da otimização dos sistemas de transporte, da geração e consumo de energia e do tratamento de resíduos. Além disso, muitos desses fatores podem estimular a resiliência nas cidades.
O Intelligent Community Forum (ICF), um laboratório de ideias com sede em Nova York, define como cidades e regiões inteligentes as que utilizam a tecnologia não para economizar dinheiro ou fazer as coisas funcionarem melhor, mas também para criar empregos de qualidade, aumentar a participação dos cidadãos e tornar os lugares atraentes para viver e trabalhar.
O primeiro-ministro da Índia, citado no começo do texto, proferiu a frase em 2014, quando lançou o ambicioso plano de construir 100 cidades inteligentes no país. Para Modi, erguer novas cidades é uma maneira de lidar com a rápida urbanização ao mesmo tempo em que compete com a China, que fez das cidades inteligentes o centro de suas políticas. No entanto, por onde começar?
O urbanista e estrategista climático Boyd Cohen desenvolveu um quadro que pode ser usado para entender o que faz de uma cidade inteligente e quais devem ser os parâmetros de referência. Os seis componentes centrais “inteligentes”, segundo Cohen, são: meio ambiente, mobilidade, administração pública, economia, sociedade e qualidade de vida.
Conforme a publicação Getting Smart About Smart Cities, grande parte das iniciativas em prol de cidades sustentáveis e inteligentes deparam com problemas acarretados por políticas descentralizadas. Os municípios usualmente tem agências ou departamentos separados para resolver importantes questões. No entanto, quando uma cidade almeja se tornar inteligente, ela precisa como primeiro passo fundamental buscar a convergência entre os mais diversos setores. Antes mesmo até de investir em tecnologia, a cidade precisa “montar um time”. Segundo um relatório da IBM, multinacional americana de tecnologia, “as cidades devem integrar sua própria administração e trabalho com outros níveis de governo, especialmente a nível nacional, assim como com os setores privados e sem fins lucrativos”.
A outra barreira nessa evolução das cidades é como financiar essas transformações. Um relatório da Organização das Nações Unidas sobre as perspectivas da população mundial indica que a população das regiões desenvolvidas permanecerá praticamente inalterada em torno de 1,3 bilhão até 2050. No entanto, a população dos 49 países menos desenvolvidos deve dobrar de cerca de 900 milhões de pessoas em 2013 para 1,8 bilhão em 2050. A maior preocupação, portanto, situa-se justamente nas cidades com menor poder de investimentos.
Na Índia, o desafio 100 Smart Cities Mission planeja o investimento de 7,5 bilhões de dólares em quatro anos, a serem gastos em infraestrutura física e social. O programa chamou a atenção de novos investidores do país e de fora dele, que reconheceram que as parcerias público-privadas são necessárias para recuperar a Índia. Os novos investimentos somam 640,2 bilhões de dólares em infraestrutura urbana até 2030. No entanto, os indianos deixaram claro: cidades inteligentes não podem existir sem governança e regulamentações inteligentes, além de reformas urgentes em nível institucional, de negócios e setoriais.
Segundo o World Economic Forum, as cidades terão de depender das parcerias público-privadas para construir e operar as novas infraestruturas físicas e digitais, “especialmente tendo em vista os orçamentos municipais, estaduais e federais cada vez mais justos e as enormes necessidades de infraestruturas globais”.
Os líderes urbanos que planejam transformar suas cidades precisam encontrar investidores dispostos a financiar projetos em uma realidade de crise na qual o mundo se encontra. Mais que isso, projetos “inteligentes” envolvem uma rede complexa em que os resultados muitas vezes só serão obtidos a longo-prazo. A questão não é simples. Por essa razão, o Smart Cities Council desenvolveu o guia Smart Cities Financing Guide, que descreve 28 ferramentas de finanças municipais à disposição dos líderes. Cada ferramenta do relatório foi usada por uma cidade para encarar o desafio de recuperar uma infraestrutura de qualidade em momentos em que o apoio financeiro do governo não era uma opção viável.
Um mundo urbanizado significa maior controle sobre o desenvolvimento e sobre possíveis crises. A conversão das cidades de hoje em cidades inteligentes determinará o futuro da humanidade. A tecnologia permitirá respostas hoje ainda nem buscadas e possibilidades quase ilimitadas. Mas estamos apenas no começo.