
Lowline: projeto que leva luz solar para debaixo da terra pode dar origem ao primeiro parque subterrâneo do mundo (Foto: Lowline/Rerodução)
Se a essência das relações humanas está nos encontros, a da vida urbana reside nos espaços públicos. Locais de circulação, descanso, lazer e convivência são, em grande parte, responsáveis pela dinâmica da vida em uma cidade: quanto mais espaços públicos, mais as pessoas estarão na rua, usufruindo e vivendo a cidade. No entanto, o crescimento populacional e a falta de espaço enfrentados por muitas cidades hoje também afetam os espaços públicos, que não encontram mais lugar para prosperar em meio aos tantos prédios que tomam as ruas.
Há pouco mais de três anos, em junho de 2013, James Ramsey e Daniel Barasch desenvolveram uma proposta inusitada para combater o problema no Lower East Side de Manhattan, em Nova York: um parque subterrâneo. O chamado Lowline (o nome é uma referência ao famoso parque suspenso da cidade, Highline) foi planejado para ocupar um antigo terminal subterrâneo do serviço de bondes que funcionava na região. O terminal está em desuso desde 1948, quando o serviço foi descontinuado, e a região é uma das áreas em Nova York que sofrem com a falta de espaços públicos.
Este mês, o ousado projeto ganhou a primeira aprovação oficial da prefeitura, que elegeu o Lowline como o projeto de revitalização para a estação subterrânea. A gestão do atual prefeito, Bill de Blasio, concordou em financiar as obras, desde que os planejadores cumpram algumas exigências, como a comprovação de eficácia da tecnologia utilizada, que deve ser capaz de manter a vegetação subterrânea ao longo de todo o ano. Nesse ponto, deparamos com o grande potencial do projeto: um novo sistema de painéis solares que poderia ser adaptado para levar luz natural ao interior de edifícios, hospitais, minas e presídios, ajudando a evitar gastos com eletricidade.
Tecnologia para transformar
Conforme o projeto, um sistema de espelhos e cabos de fibra ótica leva a luz da rua para debaixo da terra, possibilitando o cultivo da vegetação que deve constituir o parque. Desenvolvida por Ramsey, a tecnologia envolve uma espécie de claraboia remota: a luz solar atinge um escudo de vidro por meio um coletor e é direcionada para o subterrâneo por um tubo de hélio até um distribuidor instalado na ponta que a espalha pelo ambiente.
Em funcionamento, a tecnologia transmitiria os comprimentos de onda de luz necessários para a realização da fotossíntese, permitindo que plantas e árvores se desenvolvam, mesmo debaixo da terra. Além disso, durante os períodos de luz solar, assim como acontece na rua, não haveria necessidade de iluminação elétrica. Para testar, em setembro de 2012, a equipe do Lowline instalou um protótipo da tecnologia em um depósito abandonado. Deu certo: além de atrair diversos visitantes, a exibição “Imaginando o Lowline” provou que a tecnologia funcionava. Mais recentemente, a equipe inaugurou o Lowline Lab, uma nova prova do conceito e um ambiente para ver as ideias e a tecnologia em prática.
Com a aprovação da prefeitura, o projeto pode, de fato, sair do papel e se transformar no primeiro parque subterrâneo do mundo. O sucesso, no entanto, depende de outro ponto crucial: o apoio dos moradores. Representantes locais já manifestaram alguns receios da comunidade – que o parque acabe por desencadear um processo de gentrificação na área ou que se torne mais um espaço lotado de turistas e, consequentemente, pouco aproveitado pelos moradores da região.
Na visão de Ramsey e Barasch, porém, o que o projeto fará é criar um espaço público para um bairro que carece desses espaços porque simplesmente não há mais onde construí-los. Atualmente, a equipe do Lowline trabalha para mostrar que deseja a participação dos moradores em todas as etapas do projeto. Na semana passada, um grupo de crianças do bairro foi levado ao laboratório para uma oficina de design em que puderam elencar o que gostariam de ter no parque: uma casa na árvore, espaço para jogar futebol e andar de skate e patins, quem sabe uma piscina.
Nas praças, nos parques, na rua. É essencialmente nos espaços públicos que as pessoas exercem seu direito à cidade. Se tudo der certo, o Lowline pode estar pronto por volta de 2021. Esperamos que se torne um espaço que possa ser usufruído pelos moradores, onde eles sintam-se acolhidos e aptos a de fato viver sua cidade.