
(Foto: Nico Kaiser / WikiCommons)
Há menos de um mês para o início dos Jogos Olímpicos e Paraolímpicos do Rio de janeiro, a capital carioca parece pronta para receber cerca de 300 mil turistas e 15 mil atletas que competirão em 65 modalidades. A expectativa de que um alto contingente de turistas venha ao evento tem feito da mobilidade urbana um dos desafios prioritários do planejamento da cidade. Agora, sete anos desde que a cidade foi anunciada como sede de um dos maiores eventos do mundo, será que ela está preparada?
A representatividade dos deslocamentos cotidianos que têm como motivo o trabalho é alta. Se a cidade, em condições normais, já enfrenta problemas com a mobilidade, com atender à demanda extra dos jogos? Por esse motivo, nos últimos anos, o governo carioca tem mobilizado iniciativas para garantir que os deslocamentos durante o evento ocorram da melhor maneira, para todos. Mas agora será preciso esperar o início das Olimpíadas para saber se as medidas foram suficientes.
A prioridade do Rio para a mobilidade urbana foi o investimento no transporte público – que será o único meio para acessar os locais de competição dos Jogos. Foram construídos 16 quilômetros da nova linha de metrô que ligará os bairros de Copacabana e Ipanema, na zona sul, ao início da Barra da Tijuca, 156 quilômetros de corredores BRT e 28 quilômetros de rede de VLT. O investimento aliado à alternativa única para o acesso aos jogos limita o uso de carros particulares e garante a locomoção dos atletas e trabalhadores olímpicos, que serão beneficiados por 164 quilômetros reservados a faixas dedicadas de BRT, e 60 quilômetros de pistas prioritárias (carros credenciados dividirão o espaço com ônibus e táxis).
Em Londres, sede das últimas Olimpíadas, cerca de 30% dos cidadãos mudaram seus hábitos de viagem, estimulados por um programa de Gestão de Demanda de Viagens que a Agência de Transporte de Londres empregou um ano antes do início do evento. Para isso, o governo investiu em informações e treinamentos a empresas, espectadores e turistas para ajudá-los a planejar com antecedência seus deslocamentos e manter a cidade em movimento.
A medida compreendeu mais de 600 mil funcionários, e mais de três mil pequenas e médias empresas participaram de oficinas de planejamento. O programa de GDV (Gestão de Demanda de Viagens) da capital britânica também ofereceu kits de ferramentas de planejamento de negócios, e usou apresentações, eventos e ferramentas comunicacionais para assegurar que as empresas estavam prontas e poderiam continuar a operar durante os Jogos. Isso fomentou políticas de GDV que se mantiveram depois, contribuindo para a mobilidade da cidade a longo prazo.
Segundo Bruno Almeida, Analista de Mobilidade Urbana do WRI Brasil Cidades Sustentáveis, algumas medidas de GDV, como o teletrabalho, “possibilitam que muitas tarefas dos funcionários sejam realizadas remotamente de casa, de outra sede da empresa, de um café ou de outro lugar que seja adequado”. Levando em conta que o tempo médio perdido por trabalhadores do Rio de Janeiro em seus deslocamentos de ida e volta do trabalho é superior a 85 minutos, “o teletrabalho traz ganho de tempo ao funcionário e evita o estresse causado pelo congestionamento, já que elimina a necessidade de se deslocar e proporciona aumento da produtividade. Isso pode ocorrer ocasionalmente ou regularmente para um número de dias por semana ou mês previamente acordado com a organização, podendo ser até mesmo de forma total”, explica Almeida.
Em Londres em 2012, as pessoas não precisaram ficar reclusas às suas casas ou sair da cidade. A maioria apenas mudou o tempo ou a forma como se deslocou para evitar os horários de pico dos jogos. Esse reordenamento permitiu que as redes de transporte atingissem um número recorde de uso, mas sem chegar à lotação e impedir a qualidade da viagem dos passageiros. O metrô de Londres chegou à marca histórica de 4,5 milhões de viagens durante o dia de início dos jogos. Durante todo o evento, 62 milhões viagens foram feitas, 35% a mais do que o normal. Em alguns dias durante as Paraolimpíadas o total de passageiros do tubo subiu 25%.
Sem o bom desempenho da rede de transportes e essa mudança no comportamento de viagem, Londres teria experimentado congestionamentos históricos e um caos mesmo no metrô e em estações ferroviárias. No Brasil, 50% dos deslocamentos diários, em média, têm como motivo o trabalho. E pouco se falou em mudanças de comportamento para os moradores do Rio durante os jogos, com exceção dos feriados decretados e as férias escolares adiadas.
Confira o que foi pensado para a mobilidade durante o evento:
Feriados, férias escolares e ponto facultativo

Sistema BRT do Rio. (Foto: Mariana Gil/WRI Brasil Cidades Sustentáveis)
Entre as medidas adotadas, uma das principais foi a aprovação da Lei nº 1183/2015. Intitulada Pacote Olímpico, a legislação decretou feriados em três dias estratégicos para a mobilidade durante os jogos. O primeiro feriado será no dia 5, data da cerimônia de abertura no estádio Maracanã, quando 350 ônibus se deslocarão pela cidade levando 10.500 atletas ao estádio. O segundo feriado será no dia 18, quando diversas ruas serão fechadas para a realização da prova de triatlo. O terceiro, no dia 22, um dia após o encerramento da Olimpíada, quando se estima que 100 mil pessoas estarão deixando a cidade pelo Aeroporto Internacional do Galeão.
Caso seja necessário, devido ao impacto na cidade, a lei autoriza que o prefeito institua novos feriados. O estabelecimento dos feriados foi baseado nos resultados obtidos durante a Copa do Mundo de 2014, quando, nos dias de feriado parcial houve uma redução de 15% do fluxo nas principais vias e nos dias de feriado total a redução subiu para 26%.
Além disso, o período de férias escolares da cidade foi alterado e será entre os dias 1º e 28 de agosto. A perspectiva é que, com essas medidas, ocorra uma diminuição de 40% na demanda de transporte público e 25% de diminuição do volume de tráfego durante o período de realização dos Jogos Olímpicos.
Outra medida do Pacote Olímpico é permitir que sejam alterados os horários de funcionamento do comércio e repartições públicas. O Poder Judiciário carioca já noticiou que funcionará em regime de plantão, motivado pelo impacto no trânsito nos arredores do Foro e do prédio do Tribunal.
A FIRJAN, organização privada e sem fins lucrativos, com mais de 7.500 empresas associadas, também incentivou seus associados a adotarem as práticas recomendadas pela prefeitura, como Home Office, rodízio de funcionários, alteração de turnos de trabalho e férias coletivas. As medidas têm como um de seus principais objetivos promover a diminuição do deslocamento casa-trabalho em até 30% durante os Jogos.
Apesar de as olimpíadas começarem oficialmente em agosto, as mudanças já se iniciaram neste mês. Portanto, no dia 18 de julho começam as regras que ampliam restrições à circulação de caminhões (os principais pontos de restrição serão a Avenida Brasil, a Linha Amarela, a Linha Vermelha e outros dois polígonos – um compreendendo áreas da Zona Norte e Oeste e outro para a região do Centro e da Zona Sul) e também as limitações de acesso à Ilha do Fundão. Após o dia 25, a Linha Amarela terá adequações nos acessos e mudanças na via para o período olímpico.
Os veículos que forem flagrados desrespeitando as normas de restrição estarão sujeitos à penalidade de multa de R$ 1.500, conforme estabelecido pelo Decreto Nº 21.867/2016. As mudanças visam o funcionamento eficiente do sistema viário durante os Jogos.
BRT, VLT e Metrô
Desde 2009, quando venceu a competição para ser cidade sede dos Jogos Olímpicos, a rede de transportes de alta capacidade do Rio de Janeiro passou de 18% para 63%. O crescimento exponencial desse número se deve à implantação do sistema de BRT (Bus Rapid Transit) com a Transoeste (Barra da Tijuca -Santa Cruz), inaugurada em 2012; a Transcarioca (Barra da Tijuca- Aeroporto Galeão), inaugurada em 2014; e a Transolímpica (Barra da Tijuca – Deodoro), inaugurada na última semana.
Com 26 quilômetros de extensão, a nova via expressa cruza 11 bairros da Zona Oeste. E terá papel fundamental para as Olimpíadas, pois liga as duas maiores instalações de competição: o Parque Olímpico, na Barra da Tijuca, e o Complexo Esportivo de Deodoro – a estimativa é que o tempo de viagem com o novo corredor seja reduzido em 60%. Por isso, durante o evento, o sistema do BRT Transolímpica será utilizado apenas por aqueles que adquirirem o bilhete especial das olimpíadas.
Além desses corredores expressos, também faz parte da renovação o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT), que retirou 630 ônibus por hora circulando no Centro, reduzindo em até 20 toneladas diárias a emissão de CO₂ na atmosfera.

(Vantagens do VLT / Reprodução- Prefeitura do Rio de Janeiro)
Outro modo que poderá ser utilizado apenas por quem estiver trabalhando nas Olimpíadas ou portadores de ingresso, será a Linha 4 do Metrô. A construção, no entanto, atrasou e a inauguração da linha foi adiada para o dia 1º de agosto, cinco dias antes da cerimônia de abertura. O governo estadual, responsável pela obra do metrô, garante a inauguração a tempo para o evento. No entanto, o prefeito do Rio, afirmou ter um plano alternativo para apresentar Comitê Olímpico, caso a obra não seja concluída. O plano B seria criar linhas de ônibus extras para fazer a ligação entre a zona sul e a Barra usando faixas seletivas. Mas, enquanto o metrô levaria 15 minutos, de ônibus o trajeto seria três vezes mais demorado.
Assim como o BRT Transolímpica, a linha 4 do metrô será de acesso exclusivo aos espectadores dos jogos. No entanto, há polêmica em torno dos valores do Riocard especial, que será usado somente durante a competição. Apesar da exclusividade desses dois modais, o bilhete poderá ser utilizado em ônibus, BRT, VLT, trens, metrô, vans, barcas e teleféricos. A questão polêmica é que o cartão mais barato custa R$ 25, para uso ilimitado por um dia. O que encarece em até R$ 17, para quem pegar apenas um ônibus para ir e outro para voltar.
Apesar disso, o Procon Estadual afirmou que o valor do RioCard Olímpico seria abusivo apenas caso sua utilização fosse a única forma do espectador chegar aos locais de competição. E será possível chegar aos eventos pelo transporte regular. A diferença é que os transportes exclusivos serão mais rápidos e deixarão os passageiros mais perto dos locais. As informações são dessa reportagem do Globo.

(Reprodução – Prefeitura do Rio de Janeiro)
Tecnologia ajudará no deslocamento
Com a abertura da Vila Olímpica em 24 de julho, as alterações na cidade começarão mais cedo para os cariocas. Para ajudar os cidadãos e turistas a se locomoverem da melhor maneira pela cidade, a prefeitura lançou uma versão do site Cidade Olímpica, que apresenta as melhores rotas, meios de transporte, preços das passagens e vias com circulação restrita.
O site não é a única forma possível de consultar e planejar as viagens. A prefeitura homologou dois aplicativos oficiais para disponibilizar, de forma simples e prática, o banco de dados de todos os transportes — ônibus, BRT, VLT, trens, metrô, vans, barcas e teleféricos, além dos serviços especiais exclusivos para quem tiver o Cartão RioCard Jogos Rio2016.
O Trafi e o Moovit servirão como planejadores de viagens multimodal com informações em tempo real permitindo a escolha da melhor viagem e maior efetividade nos deslocamentos. Pelo banco de dados Data Rio, os aplicativos terão acesso aos mais de 50 km de linhas e novos serviços mapeados, interligando o sistema de transporte às regiões de competição – na Barra, Deodoro, Maracanã e Copacabana.
A possibilidade de saber em tempo real como está o trânsito da cidade, segundo o relatório de Londres, foi uma diferença fundamental para evitar deslocamentos desnecessários. A conexão imediata com os turistas e cidadãos e a incorporação de estratégias de rota com notificações em tempo real pode ser um facilitador para os cariocas e milhares de turistas que estarão na Cidade Maravilhosa.
De qualquer forma, o investimento em sistemas de transporte coletivo deixará um legado aos moradores do Rio de Janeiro, além de ter potencial para cumprir as necessidades de deslocamento durante as Olimpíadas e as Paraolimpíadas. Resta esperar o início dos jogos para saber se eles serão o suficiente para que tudo funcione como esperado.