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Cidades têm memória e influenciam territórios vizinhos

(Foto: John Cunniff/Flickr)

Reflexo de seus habitantes, os sistemas urbanos evoluem amparados em dois fatores: a lembrança de um passado recente e a existência de outras áreas urbanas por perto. Essa foi a conclusão de um estudo capitaneado por pesquisadores argentinos e espanhóis. Utilizando algoritmos, os cientistas concluíram que as cidades têm uma espécie de inércia ou memória de seu passado. Além disso, existe também uma interação referencial com as cidades dos arredores. Por exemplo, na Espanha, municípios com mais de 10 mil habitantes têm um tempo médio de memória de 15 anos, enquanto o seu desenvolvimento é afetado referencialmente em um raio de 80 quilômetros.

No entanto, o cálculo não seria possível se analisasse as motivações pessoais de cada indivíduo. O grupo de pesquisadores desenvolveu um algoritmo que leva em conta a análise coletiva de decisões. Os cálculos revelaram que, em nível demográfico, os acontecimentos na cidade estão diretamente ligados ao que aconteceu nos anos anteriores. “Pode parecer óbvio, mas isso implica que uma decisão tão pessoal como a possibilidade de mudar de casa ou emigrar também depende de como muitas pessoas agiram sobre esses assuntos no ano anterior de forma independente. Pessoas que, na realidade, você nunca sequer conheceu”, explica um dos autores da pesquisa, Albert Hernando, do Instituto Federal Lausanne de Tecnologia da Suíça.

O pesquisador destaca também que, uma vez que a teoria matemática que inclua as inércias e influências sobre as cidades for desenvolvida, “teremos informações importantes para a tomada de decisão territorial, por exemplo, para alertar sobre as consequências de uma decisão ruim tomada por razão eleitoral ou econômica, levando em conta que as consequências vão durar várias décadas”.

O trabalho pontua algumas evidências empíricas de correlações na dinâmica populacional de municípios americanos e compara com resultados das observações anteriores sobre a população das cidades espanholas. Em um primeiro momento, foram analisadas as propriedades estatísticas de taxas de crescimento das cidades, conforme a lei de Gibrat. A memória das taxas de crescimento foi analisada a partir de uma janela de tempo de 170 anos, o que inclui eventos relevantes históricos, como a Guerra Civil Americana, as duas guerras mundiais e a crise econômica de 1929. Após isso, foram analisadas as relações das cidades com as suas cidades vizinhas. O que levou à definição de uma distância de correlação.

Aplicação do algoritmo

Os pesquisadores aplicaram a fórmula matemática às cidades na Espanha e nos Estados Unidos. Utilizaram, para tanto, dados demográficos do Instituto Nacional de Estatísticas Espanhol do período de 1900 até 2011. Nos EUA, dados do Censo foram utilizados de 1830 até 2000. Os resultados obtidos apontam que as cidades espanholas com mais de 10 mil habitantes têm um tempo médio de memória de 15 anos. A quantidade de pessoas que se mudou em um ano estava altamente conectada ao número de pessoas que havia se mudado no ano anterior. No entanto, essa relação apresenta uma ruptura e cai pela metade após 15 anos.

Nos Estados Unidos, de acordo com os resultados obtidos, a memória das cidades dura 25 anos. Eventos trágicos como a Guerra Civil e a Crise de 29 moldaram a memória das cidades americanas, gerando uma espécie de amnésia pós-trauma, que permanece na população durante esses 25 anos de memória da cidade.

Correlação em função da distância entre os municípios d. O valor médio para uma determinada distância é indicado (linha e pontos vermelhos) em conjunto com um S.D. (Sombra mais escura) e por dois deles (a sombra mais clara). A linha preta segue o ajuste analítico da equação. A correlação espacial para cidades espanholas também é mostrada para fins comparativos (linha cinza e pontos).

Correlação entre os municípios em função da distância entre eles. O valor médio para uma determinada distância é indicado (linha e pontos vermelhos) em conjunto com um S.D. (Sombra mais escura) e por dois deles (a sombra mais clara). A linha preta segue o ajuste analítico da equação. A correlação espacial para cidades espanholas também é mostrada para fins comparativos (linha cinza e pontos).

Como as cidades vizinhas se comportam foi outro elemento abordado na pesquisa. Ao qual os cientistas concluíram que o crescimento da cidade também é determinado pela forma como os seus vizinhos se desenvolvem, e a esfera de influência varia de acordo com o país. A distância de interação típica é de 80 km em cidades espanholas e de 200 km para cidades nos Estados Unidos.

“As cidades não são objetos individuais, mas fazem parte de uma rede global e seu futuro está ligado aos seus arredores”, ressalta o pesquisador. “Isso significa que para fazer projeções para o futuro de uma cidade, você especificamente precisa saber o que vai acontecer com as cidades vizinhas também.”

Os estudos ainda estão em etapa inicial, apesar das conclusões. Os pesquisadores ressaltam em sua finalização como há, ainda, muitas questões a serem respondidas antes de chegarem ao cálculo matemático final. No estudo, eles destacam a importância de responder perguntas como: isso muda de cultura para cultura? É um fenômeno global ou aparece apenas em determinadas sociedades?

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