
O manual traz diretrizes para promover o uso da bicicleta como meio de transporte nas comunidades do Rio (Foto: Mariana Gil/EMBARQ Brasil)
Matéria publicada pela ESPN em 26/05/2014.
Por JP Amaral e Fábio Nazareth
Ocorreu no dia 20 de maio no IAB (Instituto de Arquitetos do Brasil) do Rio de Janeiro a apresentação do Manual de projetos e programas para incentivar o uso da bicicleta em comunidades. O manual foi desenvolvido pela EMBARQ Brasil em parceria com o IAB-RJ e secretarias municipais de Habitação e de Meio Ambiente do Rio de Janeiro.
Paula Rocha, coordenadora de projetos de transporte da EMBARQ Brasil, explicou que a proposta do manual é compartilhar experiências internacionais de boas práticas e infraestrutura de tal modo que mais pessoas usem as bicicletas nas comunidades e deixem de usar outros tipos de modais não sustentáveis e que tem trazido impactos severos na saúde pública, como a motocicleta.
O lançamento do manual foi precedido pela palestra do urbanista colombiano Ricardo Montezuma, atual diretor da Fundação Ciudad Humana, que promove o uso da bicicleta na América Latina. “É impressionante como pequenas ações de promoção sobre o uso da bicicleta em comunidades populares pode modificar para melhor a vida de muitas pessoas” comentou o palestrante.
Pedro da Luz, presidente do IAB e professor de arquitetura da Universidade Federal Fluminense anunciou que o lançamento do manual aponta novos caminhos, mas que é fundamental desenvolver ações em conjunto entre os modais de transporte. Ele relata que “a bicicleta deve ser inserida no conjunto de sistemas de transporte das cidades e para isso é indispensável a integração com o transporte público, como ônibus e trens adaptados para levar bicicletas, e integrar a bicicleta aos grandes modais de massa”.
O que é o Manual
O documento faz parte do programa Morar Carioca da Prefeitura do Rio de Janeiro que tem como meta a reurbanização de todas as favelas cariocas até 2020 de modo a gerar a integração social das pessoas residentes nessas comunidades.
Para pensar na mobilidade dessas comunidades, a EMBARQ Brasil realizou um estudo junto com a UFRJ-COPPE e descobriu que, apesar dos declives e áreas construídas sem planejamento, 57% das pessoas nas comunidades se locomovem de bicicleta ou a pé. Por outro lado, a grande maioria dessas pessoas se sentem inseguras ao adotar esses meios de locomoção.
Com isso em mente, este manual vem com a proposta de dar subsídios a arquitetos e urbanistas a projetarem soluções em infraestrutura para a bicicleta e fornecerem um instrumento de base para os órgãos públicos que administram essas comunidades.
O que diz o Manual
O Manual traz um apanhado de todas as etapas para se pensar na implementação da cultura de respeito e uso da bicicleta. Parece quase um compêndio de tudo que vemos por aí dos comos e por quês, material que deveria passar pela mão de todo gestor público antes de começar a mexer na cidade.
Começa com algumas dicas breves do que é essencial considerar ao se pensar e executar uma infraestrutura para bicicletas em comunidades. São estas: segurança no acesso e circulação das bicicletas, padronização orgânica da estrutura, envolvimento da comunidade no processo de ideias ou decisões e integração dessa infraestrutura com o restante da cidade.
Em seguida, o documento traz algumas referências de estudos e ideias das infraestruturas possíveis em comunidades e alguns exemplos de que tipos de ações em educação e incentivo podem ser feitas. Uma das ideias, um pouco mais mirabolante, é ter uma estação de bicicletário móvel que transportaria as bicicletas ao final do dia para a parte alta da comunidade, de modo a evitar que as pessoas precisem pedalar nas subidas. Já outras são mais fáceis de aplicar no curto prazo, como ruas abertas para pessoas no fim de semana, aproximando a comunidade das ruas e gerando a sensação de segurança. Chama a atenção também a menção de métodos colaborativos e inovadores para tratar o urbanismo e engajamento da comunidade, como a arte expressa nas paredes e asfaltos do local de forma criativa ou ferramentas de presas em bicicletários para os ciclistas fazerem a própria manutenção. As bicicletas compartilhadas, seguindo o modelo do Bike Rio já aplicado no restante da cidade também é citado.
A partir da página 44 o documento entra em um aprofundamento técnico por cada tipo de estrutura possível para incentivar a bicicleta nas comunidades nos mínimos detalhes, não deixando de lado o perfil inovador de se fazer essas estruturas, envolvendo o design e o colaborativismo.
O que eu achei do Manual
Na minha humilde opinião, de quem não é nada técnico, mas adora a inovação nas tecnologias sociais (que não são aquelas que ficam dentro de uma máquina), o documento é extremamente rico para abrir a cabeça justamente dessa tecnocracia que pensa geralmente em soluções exatas, enquanto que as cidades envolvem ciências humanas. Claro, vários dos elementos apresentados caem como utopias impossíveis para alguns, mas outras são realmente fascinantes pela facilidade de se aplicar e potencial de estabelecer de vez a cultura do respeito e prestígio do ciclista nessas comunidades.
Ver ideias como arte urbana ou estações de ferramentas de mecânica compartilhadas fez brilhar os olhos e acreditar que as soluções que tanto discutimos para nossas cidades pode ser mais fácil e próximo do que imaginamos. A todos, fica o convite de conhecer este documento.
PS: parte desse brilho nos olhos se deu por ter visto uma foto no manual de uma oficina comunitária de conserto de bicicletas que ajudei a organizar com o Ônibus Hacker láááá atrás durante a Rio+20 no Complexo do Alemão, como um “case de sucesso” para incentivar o uso da bicicleta em comunidades. Dá uma espiada na bicicleta em pé na foto abaixo (é a Kiabin, minha bike caixote!). =D