
Os governos municipais podem desempenhar um papel crucial na redução das emissões nacionais, chegando a 15% das reduções necessárias para evitar os níveis mais graves de mudança climática (Foto: Claudio Olivares Medina / Flickr)
Este post foi escrito por Leah Lazer e publicado originalmente no TheCityFix.
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Cada vez mais cidades estão agindo de forma independente – ou mesmo em oposição direta – a seus governos nacionais. Essa tendência é vista, por exemplo, no grupo Climate Mayors, formado por prefeitos estadunidenses que permanecem comprometidos com o Acordo de Paris, mesmo depois que a Casa Branca anunciou sua intenção de se retirar. Parcialmente por trás desta onda estão organizações como C40 e o ICLEI, através das quais governos locais constroem relacionamentos e trocam boas práticas entre si para além das fronteiras nacionais.
Nesse contexto, os governos nacionais deveriam assumir um papel secundário enquanto cidades com sociedades mais progressistas e politicamente mais experimentais forjam o seu próprio caminho?
Não é tão simples. Certamente, as evidências mostram que será preciso muita ação na área climática e no desenvolvimento humano nas áreas urbanas. Mas nem tudo o que acontece nas cidades pode ou deve ser feito apenas pelas cidades. Políticas nacionais têm um papel poderoso, embora às vezes sutil, na formação dos centros urbanos.
Políticas complementares
Um novo relatório de Derik Broekhoff, Georgia Piggot e Peter Erickson para a Coalition for Urban Transitions, “Construindo Cidades de Baixo Carbono: uma visão geral das opções políticas para governos nacionais”, revelou que as cidades podem contribuir com 15% da redução de emissões necessária para evitar os níveis mais graves da mudança climática. No entanto, os municípios não podem fazer isso sozinhos: os governos nacionais são essenciais para “dar um empurrãozinho” para a maioria das medidas. Algumas políticas nacionais têm efeitos diretos e intencionais sobre as cidades. Padrões nacionais para edifícios mais eficientes em energia podem reduzir a demanda municipal de eletricidade, por exemplo, e os padrões nacionais para emissões veiculares têm efeitos importantes sobre a qualidade do ar urbano.
Na Dinamarca, uma política nacional que entrou em vigor em 2011 exigia que os veículos pesados a diesel atendessem à norma Euro 4 ou instalassem um filtro de partículas. A lei impactou particularmente a qualidade do ar nas cidades daquele país, onde quase metade da poluição do ar tem origem em caminhões e ônibus a diesel. Ao mesmo tempo, o governo do país permitiu que os municípios introduzissem zonas de baixa emissão, dando aos governos locais poder para buscar políticas de redução de emissões complementares e potencialmente ainda mais robustas.
Outras políticas nacionais influenciam as cidades de maneira mais indireta e, às vezes, não intencional. Nos Estados Unidos, os subsídios nacionais aos combustíveis e os incentivos fiscais para os proprietários de residências unifamiliares acabaram contribuindo para a expansão urbana. Como as pessoas precisam se deslocar mais, aumentaram as emissões de carbono do setor de transportes. Em contraste, nos países europeus, os impostos sobre propriedades e território incentivam formas urbanas mais compactas.
Os governos nacionais também podem influenciar fortemente os tipos de fontes de energia que abastecem as cidades. Decisões nacionais para apoiar painéis solares ou usinas a carvão, por exemplo, afetam a quantidade de carbono emitida pela eletricidade em áreas urbanas de todo o país, independentemente das políticas locais.
Para além das megacidades
Os governos nacionais não são os únicos negligenciados nas conversas sobre o futuro das cidades. Às vezes é importante lembrar que apenas 13% dos moradores de zonas urbanas vivem em megacidades como Nova York ou Tóquio. Cidades de pequeno e médio porte geralmente não recebem a atenção que merecem, embora cerca de metade da população urbana do mundo viva em áreas urbanas de 500 mil habitantes ou menos.
Essas áreas serão fundamentais na luta contra as mudanças climáticas: Broekhoff, junto a outros autores, descobriu que quase metade do potencial de mitigação das mudanças climáticas urbanas reside em cidades pequenas e médias. No entanto, esses municípios provavelmente terão menos capacidade e orçamento, o que significa que dependerão mais de seus governos nacionais. Há várias formas de suporte que os governos podem oferecer, como recursos, capacitação ou financiamento para projetos urbanos.
A constituição sul-africana, por exemplo, permite explicitamente que as cidades emitam títulos de dívida municipais se preencherem condições específicas. Isso motiva os governos locais a aprimorar a arrecadação de receitas e a experimentar o financiamento de dívidas. Joanesburgo, desde então, foi pioneira na emissão de um título verde municipal, o primeiro de um mercado emergente.
As cidades serão cruciais para o combate às mudanças climáticas e para garantir um futuro melhor às crescentes populações. Muitas já estão assumindo esse papel, avançando frente aos governos nacionais na redução de emissões e ganhando elogios merecidos da mídia e de outras cidades.
No entanto, com os holofotes para as megacidades progressistas, é fácil ignorar o papel dos governos nacionais e das cidades menores em possibilitar a mitigação das mudanças climáticas. Para alcançar todo o potencial das áreas urbanas, os governos nacionais precisam alinhar as políticas federais em energia, habitação, transporte e finanças para apoiar as cidades com menos recursos a obter grandes impactos. Cidades mais verdes só podem existir em países verdes.
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Leah Lazer é analista de pesquisa da Coalition for Urban Transitions, uma iniciativa especial da New Climate Economy promovida pelo WRI Ross Center for Sustainable Cities e coadministrada pelo C40 Cities Climate Leadership Group e o World Resources Institute.