Este post foi escrito por Darío Hidalgo e publicado originalmente em inglês no TheCityFix.
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As empresas de aplicativos de transporte individual sob demanda como Uber, Easy Taxi, Ola (Índia) e Didi (China) tornaram muito mais fácil para as pessoas se deslocarem nas cidades em todo o mundo, fornecendo dados de localização em tempo real, tempos de chegada cada vez mais precisos, pagamento fácil e serviços personalizados. A instituição financeira Goldman Sachs estima que o mercado valia 36 bilhões de dólares em 2017, com 15 milhões de viagens por dia ao redor do planeta. Eles esperam um crescimento de 285 bilhões de dólares até 2030, chegando a 97 milhões de viagens por dia.
Que esses serviços são bons para a maioria dos clientes parece inegável, mas se eles são bons para as cidades ainda não sabemos. Podemos pensar que esse tipo de serviço pode ajudar a reduzir os congestionamentos e a poluição, tornando mais fácil não ter um carro e incentivando viagens compartilhadas. Menos veículos implicam menos emissões e menos congestionamentos, além de menos colisões, um grande desafio nos países em desenvolvimento, onde nove entre 10 mortes decorrentes de acidentes de trânsito são causadas por colisões.
No entanto, um estudo recente realizado por Regina R. Clewlow e Gouri Shankar Mishra, da Universidade da Califórnia em Davis, mostra que esse tipo de serviço talvez não esteja realmente tirando carros das ruas.
Mais veículos em circulação
Os pesquisadores entrevistaram 4.100 usuários do Uber e do Lyft em seis grandes cidades dos EUA: Boston, Chicago, Nova York, Seattle, São Francisco, Los Angeles e Washington DC. Eles concluíram que a maioria das pessoas optou pelo serviço em vez de utilizar o transporte coletivo, andar de bicicleta ou caminhar, e 91% dos usuários ainda possuem seus carros. Embora alguns usuários tenham combinado suas viagens com ônibus e metrô/trem, o resultado líquido foi uma redução média de 6% no uso do transporte coletivo.
Ônibus e metrôs perderam demanda, enquanto os trens metropolitanos viram um aumento no número de passageiros. Os autores da pesquisa conjecturam que, para as grandes cidades americanas, os aplicativos de transporte particular aumentaram o número total de quilômetros rodados por veículo – um cálculo que pode explicar os outros efeitos relacionados, como o congestionamento, as emissões e os acidentes. Clewlow e Mishra descobriram que, na ausência de serviços oferecidos pelo Uber e Lyft, entre 49% e 61% das viagens não teriam sido feitas ou teriam sido feitas a pé, de bicicleta ou com o transporte coletivo.
Esses resultados são compatíveis com outras novas evidências, compiladas em uma síntese por Andrés Gómez-Lobo e Alejandro Tirachini, da Universidade do Chile. Alejandro Henao estimou um aumento de 85% nos quilômetros rodados devido aos aplicativos sob demanda em Denver, baseado em 308 viagens conduzidas e pesquisadas pelo próprio autor.
Outro estudo encontrou resultados variados. Usando informações do Banco Nacional de Dados de Trânsito dos EUA, Jonathan D. Hall e outros pesquisadores estimam que o Uber contribuiu para reduzir o número de passageiros do transporte coletivo em 5,7% em cidades americanas menores, mas ajudou a aumentá-lo em 0,8% nas cidades maiores.
Outros relatórios, não incluídos na lista revisada por Tirachini e Gómez-Lobo, como os produzidos por um consórcio dos municípios do sul de Los Angeles e uma empresa de consultoria independente, sugerem conclusões semelhantes: serviços como Uber podem aumentar o congestionamento e diminuir as viagens do transporte coletivo e de outros modos.
Para além dos Estados Unidos
A onipresença do Uber e do Lyft, a grande quantidade de dados disponíveis e o interesse de pesquisadores e financiadores têm gerado muitos estudos nos Estados Unidos, mas e em outros contextos?
Tirachini e Gomez-Lobo desenvolveram um modelo sofisticado na tentativa de responder a essa pergunta em Santiago, Chile. Em um trabalho, eles usam um modelo multimodal e dados de 1.600 pesquisas para medir o efeito do Uber no uso do táxi, carro e ônibus. Sob um cenário de base, com as taxas de ocupação existentes e outros parâmetros observados atualmente, os autores descobriram que a probabilidade de os transportes sob demanda reduzirem o número de quilômetros percorridos em Santiago é zero. Eles executaram 20 mil simulações, e a presença desse tipo de serviço nunca produziu menos quilômetros viajados por veículo do que a mesma simulação sem eles.
O resultado é explicado em parte pela substituição de viagens anteriormente realizadas por transporte coletivo, pela adição de novas viagens e, em menor medida, pela substituição de viagens de Uber por outros modos de transporte, como caminhar e andar de bicicleta. A maioria dos usuários do Uber no Chile advém dos táxis (41%) e do transporte coletivo (33%). Cerca de 12% vêm do carro, 2% do transporte a pé e 1% da bicicleta. Cinco por cento não teriam nem feito uma viagem. As famílias de renda mais alta substituem principalmente o uso de táxis e do carro privado, enquanto as famílias de baixa renda substituem mais o uso do transporte coletivo. Metade das pessoas que deixaram de usar o transporte coletivo para usar o Uber teria usado o ônibus anteriormente.
Tirachini e Gomez-Lobo ajustaram alguns parâmetros e concluíram que eram necessários pelo menos 2,9 ocupantes por veículo nesses serviços – diante da taxa atual de 2 – para existir a chance de reduzir os quilômetros rodados de carro nas cidades.
E daqui para frente?
Embora não definitivas, as conclusões de Tirachini e Gomez-Lobo fornecem uma indicação de que os aplicativos de transporte particular podem ser benéficos para os usuários, mas, no seu formato atual, não são sustentáveis para o planeta ou ajudam a resolver problemas de congestionamento e segurança viária.
Em sua pesquisa em Santiago, concluíram que as razões mais importantes pelas quais as pessoas optaram pelo Uber foram a facilidade de pagamento, custo, transparência do sistema de cobrança em comparação com os taxímetros e a possibilidade de identificar o motorista e avaliar seu atendimento. Outros motivos importantes incluem tempos de espera curtos, falta de transporte coletivo conveniente, a possibilidade de ingerir álcool e não precisar dirigir e a percepção de que o serviço é mais seguro que outros modos. Esses motivos são compatíveis com outros estudos e sugerem que o compartilhamento de viagens não irá desaparecer tão cedo.
Fazer com que esses serviços de transporte sejam eficientes na redução dos quilômetros percorridos por veículos e, assim, reduzir as emissões, o congestionamento e outros efeitos negativos relacionados, pode exigir diferentes estratégias combinadas. Encontrar maneiras de aumentar o número de ocupantes por veículo é uma delas. Serviços compartilhados como o UberPool e a Lyftline representaram 20% das viagens oferecidas por Uber e Lyft em 2016. Outra opção é vincular e aproximar esses serviços ao transporte coletivo através de viagens subsidiadas para estações, com o objetivo de incentivar o uso do transporte coletivo em vez de substituí-lo. Estipular taxas de congestionamento para veículos de baixa ocupação é outra abordagem, que já vem funcionando para reduzir o tráfego em algumas cidades.
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Jyot Chadha e Diego Canales contribuíram para esse post.