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O futuro do transporte coletivo (parte final): as cidades assumem o controle
Teresina, Piauí (foto Mariana Gil/WRI Brasil)

Teresina, Piauí (foto Mariana Gil/WRI Brasil)

Carros autônomos, elétricos, compartilhados? Transporte individual, sob demanda, coletivo? O transporte urbano vive um momento de constantes transformações. Nesta série, originalmente publicada na Revista NTU UrbanoLuis Antonio Lindau, diretor do programa de Cidades do WRI Brasil, reflete sobre o impacto dessa revolução nas cidades.

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Vivemos em plena era da tecnologia, na qual os avanços ocorrem em escala exponencial. Natural imaginar que as transformações no ambiente urbano e na mobilidade precisem acompanhar a dinâmica acelerada do novo milênio. Nos últimos dois artigos falei sobre como a inovação precedeu a regulação do transporte ao longo da história e projetei um futuro pouco animador caso as cidades não assumam a gestão da mobilidade como um todo. Chegou a hora de refletir sobre a realidade que ora se impõe e o caminho para reverter esse cenário: como fazer com que as cidades brasileiras passem a controlar toda a oferta de transporte?

Hoje, a gestão da mobilidade urbana não alcança o todo. Diferentes modais raramente têm integração física, operacional e tarifária. Pelo contrário, muitas vezes disputam entre si. Não há um incentivo ao uso mais inteligente dos recursos e da infraestrutura. Cidades vizinhas não se conversam. É comum diferentes linhas apresentarem sobreposição ao percorrerem trajetos semelhantes. E, dia a dia, cai o volume transportado de passageiros. Mesmo diante desse quadro, para onde apontam as atenções da mídia, dos usuários, da população em geral e dos tomadores de decisão? Para o valor da tarifa.

Cidades precisam cada vez mais ser as protagonistas de suas histórias, com administrações que catalisem inovações em vez de serem pautadas pelos provedores de serviços. Caminhamos para um futuro no qual não cabem veículos poluentes circulando de forma ineficiente com poucos passageiros, nem congestionamentos de carros autônomos, mesmo se movidos a energia limpa. Enquanto o mercado segue independente, puxando as inovações, compete ao setor público trabalhar por uma rede multimodal integrada de dimensão metropolitana. Essa rede precisa contemplar os grandes eixos de deslocamento e prover acessibilidade local. Ao se alinhar aos planos diretores e ao planejamento, ela fomenta tanto o desenvolvimento urbano como a mobilidade do amanhã.

Algumas razões apontam para a urgência da mudança. Segundo diversas projeções, a transição para carros elétricos e autônomos será rápida e tornará algumas tecnologias obsoletas da noite para o dia. Isso transforma a montagem de qualquer contrato de médio prazo vinculado a uma tecnologia de hoje – e não à provisão de um serviço – um grande desafio. A mobilidade urbana precisa ser entendida na lógica do século atual em que as pessoas buscam diversidade de escolhas e soluções sob demanda. As decisões se baseiam cada vez mais na maximização de utilidades. Por exemplo: posso fazer parte do trajeto de bicicleta e assim me exercitar? Ou usar o tempo de deslocamento de forma útil? Desperdiçar tempo dirigindo definitivamente não atrai as novas gerações.

Nosso transporte coletivo enfrenta dificuldades de financiamento. Cide urbana? Sim, espera-se que vire lei, mas é preciso ir além. Com tanta tecnologia disponível seria de imaginar que as cidades brasileiras passassem a taxar os serviços de transporte por aplicativos de forma dinâmica e em sintonia com janelas de tempo e espaço, como desincentivo à operação fora de zonas determinadas. São Paulo bem que tentou! A propósito, poderia surgir dessa experiência uma forma inteligente de introduzir, no contexto brasileiro, um mecanismo de cobrança pelo ganho de tempo dos que insistem em usar o carro nas áreas urbanas mais procuradas.

Existem outras receitas extratarifárias para cobrir os custos de uma rede integrada, como taxação do estacionamento, aluguel de áreas comerciais, captura de mais valia territorial, entre tantas experiências aplicadas com sucesso mundo afora. É hora de agir, de unir talentos e esforços para oxigenar a mobilidade urbana brasileira, ainda despreparada para atender às novas demandas da sociedade por estar presa aos paradigmas do século passado.

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