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Muros carrancudos, empenas tristes, fachadas desfalecidas
etnias, Eduardo Kobra, Rio de Janeiro

Mural Etnias, no Rio de Janeiro (Foto: Agência Brasil Fotografias/Flickr)

Por Vicente Loureiro, diretor executivo da Câmara Metropolitana de Integração Governamental do Rio de Janeiro

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O que fazer diante dessas ocorrências frequentes no cenário urbano? Muros altos, interrompendo a vista e proibindo a transição entre o público (a rua) e o privado (a casa) ou fachadas laterais de prédios inteiramente lisas, sem janelas abrindo ou sinal de diálogo entre o universo fechado de quatro paredes e o horizonte sem fim da cidade. Ou ainda, fachadas de janelas trancadas, denunciando o desuso dos imóveis.

Compartilho essas perguntas com vocês diante da recente atitude do prefeito de São Paulo, João Doria, de mandar pintar de cinza os muros laterais da Avenida 23 de Maio, no Centro, importante via que faz a ligação do Centro da capital paulista até o aeroporto de Congonhas, cobrindo os grafites de diversos artistas urbanos. Acompanhei o resultado por jornais e pela televisão. Não tenho dúvidas: a paisagem urbana de São Paulo, uma das mais eletrizantes do mundo, ficou mais pobre, perdeu em viço e surpresa. Acinzentou-se e empalideceu.

É verdade que as pichações sujam e agridem fachadas cuidadas com esmero, irritam proprietários ou usuários de imóveis que gostam de tratar bem o lado público de sua edificação, numa espécie de ato de reverência ou pequena contribuição de ver a cidade mais bonita. Há os que defendem estes atos como forma de expressão da identidade dos jovens e excluídos das oportunidades oferecidas pelas cidades. Ou uma forma de expressarem o exercício pleno de cidadão ativo e de querer pertencer de algum modo àquele lugar.

Com o grafite, esse tipo de polêmica já foi superado. Aceita-se hoje como forma de arte, batizada inclusive de “street art”. Está presente em todas as cidades do mundo. Em algumas delas, bairros inteiros tiveram seus muros, empenas e fachadas grafitadas integralmente, e o simples circular por suas ruas e becos foi transformado em percurso de verdadeiras galerias de arte a céu aberto, virando inclusive destino turístico e motivo de revitalização econômico-social de um ambiente urbano outrora degredado ou estagnado.

Muros carrancudos, empenas tristes ou fachadas desfalecidas são alvos de grafite não só pela necessidade de espaço dos artistas urbanos. São pedaços da paisagem urbana gerados por falha da legislação ou por um cochilo do mercado. Talvez isto soe para alguns algo utópico, mas não parece impossível desejar no futuro cidades sem tantos muros e empenas cegas ou fachadas de janelas sem uso, pois são sinais claros de desperdício de espaço e de funções. Quanto ao grafite, haverá sempre um recanto de viaduto ou pedaço qualquer de concreto cinza clamando para se fazer bonito na cidade.

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