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“Nova mobilidade” pode levar mais pessoas para o transporte coletivo
Serviço sob demanda nos Estados Unidos

Empresas americanas de transporte coletivo já começaram a testar parcerias com aplicativos como Lyft. (Foto: Sergio Ruiz/Flickr-CC)

Parece uma união improvável, mas a chamada “nova mobilidade” pode ter a chance de contribuir para os sistemas de transporte coletivo. Desde que surgiram, as companhias que dão ao usuário a oportunidade de obter transporte por meio de um simples aplicativo de celular não saem das manchetes, que predizem o fim dos modos convencionais. É difícil, porém, que isso ocorra no futuro, principalmente se as novidades forem encaradas como um complemento e não como competição.

Lançada recentemente pela TransitCenter, fundação americana que trabalha pela melhoria da mobilidade urbana, a publicação “Private Mobility, Public Interest” discute as formas como agências de transporte podem “se conectar” com opções disruptivas de mobilidade. O estudo entrevistou mais de cem pessoas do setor de mobilidade em organizações públicas e privadas e afirma: se agências de transporte seguirem com valores que buscam oferecer transporte sustentável, acessível, eficiente e equitativo, podem tecer novas parcerias que permitirão benefícios públicos ainda mais amplos.

Os emergentes meios de transporte aliados a novas tecnologias, que atualmente permitem bicicletas compartilhadas, carros compartilhados, serviços sob-demanda, entre outras possibilidades, dão às agências de transporte público duas grandes oportunidades: fornecer mais opções de transporte para melhorar as escolhas do usuário e oferecer novas ferramentas que proporcionam serviços melhores e mais eficientes. “Serviços emergentes de mobilidade são apenas uma peça de uma rede eficiente na qual o transporte coletivo é a espinha dorsal – o meio mais eficiente de mover um grande volume de passageiros de forma igualitária e acessível -, e a caminhabilidade é a melhor opção para os trechos iniciais e finais de um deslocamento”, diz o texto.

Independente do objetivo de aplicativos como Uber, Car2Go ou Lyft, tais ferramentas não irão substituir o transporte coletivo. Elas podem, sim, trazer implicações em curto e longo prazos, porém essas podem ser convertidas em parcerias positivas.

VLT do Rio de Janeiro

(Foto: Mariana Gil/WRI Brasil Cidades Sustentáveis)

Recentemente, o presidente da Associação Americana de Transporte Público (APTA), grupo do setor que representa todas as agências de transporte dos Estados Unidos, anunciou que “juntamente com companhias como Lyft e Uber, estamos unidos para criar um estilo multimodal dinâmico”. “A maneira como as pessoas se deslocam nas cidades está sendo transformada, e o transporte coletivo está no âmago dessa mudança”, disse Michael Melaniphy.

Um estudo do APTA confirma algo um tanto óbvio para muitos usuários: novos aplicativos não servem ao mesmo propósito que o transporte coletivo. Em geral, usuários não abandonam o transporte coletivo, eles apenas utilizam o Uber, por exemplo, em viagens específicas e eventuais. O relatório Shared Mobility and the Transformation of Public Transit aponta, por exemplo, que os aplicativos poderiam suprir os “buracos” deixados pelos serviços públicos. “Como a pesquisa mostra, pessoas que utilizam transporte público e esses serviços compartilhados estão transformando suas formas de locomoção, o que resulta em mais caminhabilidade, menos carros e mais economia devido aos menores custos de transporte”, afirmou Valarie J. McCall, chair da APTA.

As agências de transporte Pinellas Suncoast Transit Authority (PSTA), na Flórida e a Kansas City Area Transportation Authority (KCATA), no Texas, já começaram a colocar em prática essa ideia e percebem os efeitos de incentivar as pessoas a usarem aplicativos de viagens para os deslocamentos apé e a partir das estações de transporte coletivo. A PSTA fechou uma parceria com a Uber e a United Taxi, uma empresa de táxis, que visa assumir rotas em que o transporte tradicional não é rentável. A agência oferece subsídio tarifário de 50% – de no máximo três dólares – a usuários que usam o serviço do Uber ou da United Taxi. A bonificação é disponibilizada para as pessoas que acessam um dos dois pontos de ônibus específicos em uma designada zona de Pinellas Park entre as 7h e as 19h de qualquer dia exceto no domingo. Já a KCATA se uniu a Bridj, uma companhia de transporte sob-demanda, para oferecer serviços adicionais a rotas fixas entre dois bairros centrais da cidade em horários de pico.

Por outro viés, a Bay Area Rapid Transit (BART), sistema público de transporte de São Francisco, escolheu dar suporte aos serviços não-tradicionais. A BART loca vagas de estacionamento para provedores de carros compartilhados perto das estações. Usos ainda mais abrangentes podem provar os benefícios dessas parcerias. As cidades de Boston e Washington, por exemplo, experimentam o uso de táxis como alternativa às vans destinadas aos usuários com deficiência física. Esse tipo de serviço, exigido pela lei relativa aos cidadãos com deficiência (Americans with Disabilities Act), está geralmente entre os mais custosos para as agências. As parcerias possibilitam o agendamento de transporte com apenas uma hora de antecedência e custa muito menos que o serviço antigo.

Sistema de bicicleta compartilhada em Salvador.

(Foto: Mariana Gil/WRI Brasil Cidades Sustentáveis)

O estudo da APTA afirma que representantes de cidades com sistemas robustos de transporte coletivo mostraram não ter preocupação alguma com o impacto que novos modos podem causar. Já as agências de transporte coletivo com deslocamentos dispersos ou com maiores problemas para abastecer suas linhas mostraram interesse nas possibilidades de novas opções complementares de mobilidade.

Em um cenário perfeito, todas, ou pelo menos a ampla maioria das pessoas, sairiam todos os dias de casa para trabalhar ou estudar sem a necessidade de utilizar carros. O transporte ativo e o coletivo seriam as duas únicas maneiras de deslocamentos diários. A utilização de mais carros nas ruas gera dúvidas – mas, na medida em que leva as pessoas até os modos utilizados para percursos maiores, pode ser um caminho. O sucesso dos avanços em mobilidade será julgado pela habilidade em suscitar comportamentos mais sustentáveis nos usuários. O desafio não é mais criar uma tecnologia que ajude as cidades a se locomoverem: o desafio, agora, é enxergar novas possibilidades que possam ser aliadas às antigas.

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