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O que a bike tem a ver com a emancipação feminina?

Sabe-se que as discussões sobre as conquistas que envolvem a mulher ganharam força na última década: normas e padrões de gênero vêm sendo questionados e repensados por quem acredita na igualdade de direitos entre as pessoas. Há pouco mais de um século, as mulheres que já buscavam paridade nas relações sociais viram na bicicleta uma ferramenta de emancipação.

Numa perspectiva histórica, a urbanização das metrópoles contribuiu para a desconstrução de alguns valores patriarcais ao trazer novos meios de transporte para as cidades. Surpreendentemente, a bicicleta influenciou fortemente as transformações da época, pois não era vinculada a papeis de gênero. Nela se viu um modal igualitário e nivelador entre os sexos, que permitia a livre circulação de mulheres pelas ruas, prática mal vista nos idos de 1910.

“A mulher está pedalando em direção ao sufrágio”, disse a feminista Elizabeth Staton (1815-1902), referindo-se ao direito ao voto feminino. Ainda que para as inglesas essa conquista tenha acontecido apenas no fim da Primeira Guerra Mundial, elas protagonizaram, antes disso, uma profunda mudança no vestuário por meio do ciclismo.

Corpos femininos eram, até então, confinados em espartilhos apertadíssimos, impróprios para diversas atividades – como respirar. Ele foi substituído por roupas que desrespeitavam menos a anatomia feminina, como o colete Spencer e a saia bufante.

Colete Spencer (à direita) e calça Bloomer (à esquerda). Fonte: Portal Pop

Para a artista plástica Angélica Oliveira, o colete Spencer foi responsável por subverter a regra que imperava na moda do século XIX que determinava o uso de calças para homens e saias para mulheres. Assim, se passou a discutir a nova dinâmica social representada na presença das mulheres circulando pelas ruas em atividades de lazer.

A ciclista hoje

É óbvio que a relação entre as mulheres e a reafirmação de seu espaço vai muito além da mobilidade urbana, mas este já pode ser considerado um bom indicador de quão agradável e segura uma cidade é para se viver. Uma pesquisa liderada pela Ciclocidade, divulgada em março do ano passado, soou um alarme: a média de brasileiras pedalando não chegou a 7% nas 39 contagens de ciclistas, realizadas entre 2008 e 2015, em diversas cidades do país, incluindo São Paulo e Rio de Janeiro.

Ainda que a bicicleta fosse vista pelas feministas do século XIX como símbolo de empoderamento, as mulheres deste século continuam sendo obrigadas a lidar com fatores que desestimulam o uso da bike no dia a dia. As colunistas Ana Carolina Nunes e Marina Harkot escreveram sobre isso: “Que mulher nunca trocou a saia por uma calça antes de sair pedalando ‘por medo de mostrar demais’ e ouvir algum ‘elogio’? Sem contar as histórias contadas por – pelo menos – alguma mulher próxima sobre o ‘cuidado’ disfarçado de quando algum estranho demonstra sua preocupação através de um ‘gata, vai para a calçada’ ou ‘cadê o capacete nessa cabecinha linda’?”. É, dá quase vontade de que outro meteoro atinja a Terra.

Felizmente, o mundo vive um momento ímpar de enfrentamento aos preconceitos e mudanças histórico-culturais. Se 2015 foi o ano do protagonismo feminino, imagina o que 2016 vai trazer! Algumas mudanças assustam, mas esta não é uma delas: este é o tipo de transformação que carrega muita esperança – de melhorar as cidades, de trazer mais felicidade e encorajar mais mulheres a tomarem as ruas com suas bikes.

“Andar de bicicleta fez mais pela emancipação da mulher do que qualquer outra coisa no mundo”, disse a feminista Susan Anthony. (Foto: Mariana Gil/WRI Brasil Cidades Sustentáveis)

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