A relação entre a quantidade de estacionamentos nas cidades e o aumento nos deslocamentos feitos de carro é um tópico de discussão característico no planejamento urbano. A disponibilidade de estacionamentos nas cidades é uma consequência do aumento da frota de veículos e do uso do carro ou, ao contrário, é a causa desse crescimento?
Vagas em excesso e a um custo relativamente acessível tendem a estimular o uso do automóvel individual, piorar os congestionamentos e aumentar a dependência do carro como meio de transporte. Ainda assim, em todo o mundo, muitas cidades estabelecem, em seus planos diretores, a construção de um número mínimo de vagas de estacionamentos para empreendimentos, tanto residenciais quanto comerciais. De modo geral, a oferta de estacionamentos é vista não como a causa para taxas de motorização cada vez mais altas, mas apenas como uma consequência.
Na última semana, porém, durante o TRB 2016, um novo estudo apresentado analisou a relação entre estacionamentos e o uso do carro e mostrou como a oferta do primeiro está diretamente ligada ao aumento do segundo. A partir da metodologia conhecida como “Critérios de Hill”, que utiliza a associação estatística para comprovar evidências de causalidade, o estudo demonstrou que aumentar a taxa de disponibilidade de vagas de estacionamento de 0,1 para 0,5 por pessoa está associado com um aumento da participação do automóvel na divisão modal de quase 30%.
Os autores da pesquisa, Chris McCahill, da State Smart Transportation Initiative, e três estudantes da Universidade de Connecticut, utilizaram dados de cidades dos Estados Unidos das décadas de 1960, 1980 e 2000 para analisar a área destinada a estacionamentos. Embora algumas das cidades não tenham registrado um crescimento populacional significativo no período, o estudo mostrou que, em um dos exemplos analisados, o aumento de 0,2 para 0,5 vaga de estacionamento por pessoa fez com que a parcela de deslocamentos feitos de carro passasse de 60% para 83%.

Relação entre a taxa per capita de vagas de estacionamento e índice de deslocamentos de carro em cidades nos Estados Unidos (Fonte: McCahill et al, “Effects of Parking Provision on Automobile Use in Cities: Inferring Causality”, 2016)
Embora a associação estacionamentos-uso do carro não satisfaça todos os critérios da metodologia, os autores acreditam que, considerando os custos e os efeitos negativos dos estacionamentos, os resultados obtidos são suficientes para justificar a adoção de políticas de restrição e redução da disponibilidade de espaço para estacionamentos os nas cidades.
O uso excessivo dos carros como meio de transporte nas áreas urbanas gera congestionamentos, degradação ambiental e impactos negativos para a saúde e a segurança. Mitigar fatores que contribuem para o aumento da motorização, portanto, é uma forma de tornar as cidades mais saudáveis e seguras. São Paulo, por exemplo, sancionou o novo Plano Diretor e acabou com a exigência de um número mínimo de vagas por metro quadrado construído. O que está em jogo, afinal, é a vida das pessoas.
(Fonte: CityLab)