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Afinal, por que as mulheres não pedalam?

(Foto: Claudio Olivares Medina/Flickr)

Tudo bem… nós, mulheres, pedalamos sim. A questão é que ainda somos a minoria dos ciclistas nas cidades latino-americanas. Se os desafios em construir a cultura da bicicleta já são muitos – especialmente ao pensarmos em políticas de uso do solo, infraestrutura e limites de velocidade – criar um ambiente seguro para todos, especialmente mulheres e crianças, é mais desafiador ainda.

Nossas cidades foram historicamente construídas para o automóvel individual e, agora, felizmente, avanços estão ocorrendo para mudar paradigmas com relação ao transporte sustentável. Mas quando saberemos qual é o cenário ideal para pedalar? Talvez a resposta seja esta: quando mulheres e crianças estiverem pedalando nas ruas.

Pelo menos é esta a lição que podemos tirar com a experiência dos locais mais cicláveis do mundo. Uma pesquisa da Universidade de Rutgers, dos Estados Unidos, analisou o perfil dos ciclistas na América do Norte, Europa e Austrália e concluiu que os países com mais mulheres se deslocando sobre duas rodas são a Holanda (55% do total de ciclistas), a Alemanha (49%) e a Dinamarca (45%).

Mas por que mais mulheres pedalam nesses países? Em primeiro lugar, podemos falar sobre infraestrutura. As melhores cidades para pedalar no mundo são europeias e muitas delas estão concentradas na Holanda, Dinamarca e Alemanha de acordo com o Índice Copenhagenize, que avalia critérios como infraestrutura, amparo legal, programas de compartilhamento e aluguel de bicicleta, segurança, políticas, planejamento urbano e trânsito.

A segurança viária também é um quesito que impressiona e estimula o uso da bicicleta nesses três países, segundo o mesmo estudo. A cada 100 milhões de km pedalados, o número de pessoas mortas na Dinamarca, Holanda e Alemanha é, respectivamente, de 1,03; 1,24; e 2,43.

América Latina e mulheres no pedal

Ao contrário do panorama europeu, cidades da América Latina e Caribe têm menor representação feminina no pedal (pra não dizer menor representação da bicicleta por si mesma). O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) analisou dados sobre a utilização do modal a fim de apoiar políticas públicas em seu apoio. Conforme o relatório “Ciclo-inclusão na América Latina e Caribe: Guia para impulsionar o uso da bicicleta”, as três cidades com maior expressão feminina na bicicleta são Montevidéu, Uruguai, (40%), Córdoba, Argentina (38%) e Cidade do México, México (38%). Já aquelas com menor são Santiago, Chile (17%), La Paz, Bolívia (15%) e Medellín, Colômbia (5%).

Uma pesquisa publicada no periódico da Universidade Federal de Pelotas mapeou o perfil e os fatores que motivam homens e mulheres a pedalar na cidade de Rio Claro, São Paulo, com 186.253 habitantes. Segundo o estudo, ambos homens e mulheres ciclistas apresentam características semelhantes, como idade entre 20 e 39 anos, classe C e casados ou solteiros, e escolaridade igual ou superior ao 2º grau completo.  A motivação para pedalar, no entanto, é que varia. O uso pelos homens está relacionado à classe econômica e escolaridade; pelas mulheres, por sua vez, entre os fatores associados à utilização da bike como meio de transporte estão faixa etária, classe econômica, índice de Massa Corporal e situação trabalhista.

Não podemos esquecer, contudo, dos fatores culturais que desestimulam a adoção da bicicleta pelas mulheres. É de praxe: ao sair na rua, as mulheres são vistas como um pedaço de carne e estão expostas a todo tipo de comentário. Ao usufruir de seu direito de ir e vir de bicicleta, num ambiente predominantemente masculino, não seria diferente e pode ser até pior.

A realidade nas ruas não é amigável o bastante para que todas as mulheres sintam-se encorajadas a pegar a bicicleta e sair por aí a pedalar. A cidade e os cidadãos precisam encorajar este meio de transporte ao prover infraestrutura e respeito necessários. As mulheres latino-americanas precisam ganhar a bicicleta, mas talvez a bicicleta precise ganhar antes as ruas. A bicicleta é eficiente, silenciosa e limpa, econômica e, acima de tudo, uma questão de cultura.

Você concorda ou discorda? Mande um email contando sua opinião.

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