
Berço de importantes fábricas automobilísticas, Stuttagart, na Alemanha, é exemplo de planejamento urbano sustentável. (Foto: Christoph Heinrich)
por Kaiodê Biague*
A proximidade da Conferência Rio+20 e da Cúpula dos Povos, em junho, assim como a mobilização de diversos atores sociais em torno do Fórum Social Temático e os desastrosos eventos na Cracolândia (centro de São Paulo) e em Pinheirinho (São José dos Campos) evocam a necessidade de pensarmos o espaço urbano como um complexo ecossitema, onde o equilíbrio depende da cooperação entre todos os agentes que atuam neste território. Assim como na ecologia sabemos que essas relações muitas vezes são predatórias, principalmente, quando não há diálogo e participação – peças chaves para o desenvolvimento sustentável das cidades.
Os desafios colocados ao planejamento urbano para as próximas décadas ampliam ainda mais a multidisciplinaridade do tema. Não cabe mais à arquitetura e urbanismo a exclusividade sobre as cidades, pois tudo está conectado, seja habitação, transporte, saúde, economia ou cultura. Passado o boom da arquitetura moderna, em especial, do chamado Estilo Internacional, diversas cidades européias de diferentes portes têm apresentado excelentes resultados no quesito desenvolvimento sustentável.
Várias dessas práticas foram registradas pela arquiteta e jornalista francesa Dominique Gauzin-Müller, em seu livro Arquitetura Ecológica, publicado originalmente em 2001, e lançado em português pela editora Senac em 2011. Estruturado quase que em forma de guia, com leitura simples e rápida o livro aborda temas que vão da escolha de materiais a consolidação de planos diretores. No trecho abaixo, a autora apresenta alguns princípios para o planejamento das cidades sob a ótica da ecologia urbana.
A ecologia urbana
O professor alemão Ekhart Hahn foi um dos primeiros militantes da ecologia urbana. Em sua obra Ökologische Stadtplanung (Planejamento urbano ecológico), de 1987, ele definiu os elementos que deveriam ser levados em conta no desenvolvimento urbano sustentável e propôs as primeiras medidas para alcançá-lo. Um projeto internacional reunindo pesquisas teóricas e estudos de caso resultou, no início dos anos 1990, em um relatório, o Ökologischer Stadtumbau (Reestruturação urbana ecológica), que destacou oito diretrizes:
- ética e respeito ao ser humano;
- participação e democratização;
- organização em redes;
- retorno à natureza e às experiências sensoriais;
- uso misto e densidade urbana controlada;
- respeito ao genius loci (o espírito do lugar);
- ecologia e economia;
- cooperação internacional.
Essas diretrizes, aliadas a uma estratégia de desenvolvimento ecológico dos bairros, ao estabelecimento de “ecoestações” – centros de informação, comunicação, atividades e de cultura – e a uma série de medidas distribuídas nos três setores de intervenção (ver quadro a seguir), constituem as ferramentas da ecologia urbana.
O urbanismo sustentável depende da responsabilidade política de homens e mulheres, assim como da competência dos profissionais da cidade, do meio ambiente, dos serviços públicos, da arquitetura e da construção. Ele permite valorizar o patrimônio construído e paisagem, riqueza social e economia de um município. Tem consequências positivas sobre o cotidiano da cidade:
- cidade limpa, menos barulhenta e menos poluída;
- tráfego que prioriza pedestres e ciclistas;
- espaços públicos mais agradáveis;
- vida social e senso cívico estimulados.
Para que as cidades sejam sustentáveis e viáveis, é preciso reduzir seus impactos prejudiciais sobre o meio ambiente e criar condições de vida e de trabalho agradáveis para os habitantes.
A implantação de um urbanismo ecológico exige compromisso dos poderes públicos e posicionamento firme das lideranças políticas. Os municípios mais ativos são os que conhecem uma grande expansão demográfica, como a pequena cidade austríaca de Mäder, e aquelas que, como Stuttgart (Alemanha), têm os meios econômicos para tornar medidas de grande peso. Freiburg im Breisgau (Alemanha) e Rennes (França) são duas cidades universitárias em plena expansão, onde ecologistas motivados iniciaram um projeto urbano que respeita o desenvolvimento sustentável.

Fonte: Ekhart Hahn, Ökologischer Stadtumbau, Théorie und Konzept Frankfurt am Main: Haagen & Herchen, 1987
*Kaiodê Biague – além de estudante de arquitetura pelo Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, em Belo Horizonte, costuma fazer uns freela como designer gráfico, ama a cultura urbana e sonha com o dia em que as pessoas utilizarão os transportes públicos por opção e não pelo contrário.